NONIUS
nš16 ISSN 0870-7669 1990
Folha Informativa do Projecto "Computação no Ensino da Matemática"

Nome: Tetris
Autor: A. Pajitnov e V. Gerasimov
Computador: Spectrum, Atari, Macintosh, PC's, etc.
Tipo: Jogo de Estratégia
Distribuidor original: AcademySoft, Moscovo, URSS

Dados dois quadrados iguais, podemos com eles construir uma figura juntando-os por um lado:

Esta figura chama-se um dominó. Como é evidente, existe um e um só dominó, isto é, não é possível, por este processo, obter uma figura diferente. (Não se consideram diferentes daquela as figuras

etc., que se obtêm dela rodando-a no plano.)

Com três quadrados iguais, e sempre seguindo a regra de que qualquer quadrado tem que estar ligado a pelo menos um outro por um lado, há duas figuras possíveis:

 

Só há, portanto, dois trominós (há quem prefira a designação triminós).

Passando de três para quatro quadrados, deparamo-nos com um problema novo. as figuras em cada um dos seguintes pares

devem ser consideradas iguais ou diferentes? (Em cada par, pode passar-se de uma para outra mediante uma simetria, ou uma rotação no espaço.) Isto é uma questão de convenção. Se as considerarmos diferentes, há exactamente sete tetrominós.

Podíamos agora continuar, com cinco quadrados (obtendo os chamados pentominós), com seis quadrados (obtendo os hexominós), etc., Estas figuras são conhecidas sob a designação colectiva de poliominós.

Uma questão interessante é a de se saber, dado um número natural n, quantos poliominós há constituídos por n quadrados. Convencionando considerar diferentes dois poliominós simétricos, podemos já construir a seguinte tabela:

Exercício para o leitor: Continue a tabela com o caso n=5.

Do ponto de vista teórico, é um exercício simples construir todos os n-ominós, para cada natural n, conhecidos que sejam todos os (n-l)-ominós. Basta, para cada um destes últimos, acrescentar um quadrado em todas as posições possíveis, e depois, na lista completa assim obtida, eliminar os repetidos. Feito isso, resta contá-los para saber quantos há. Claro que isto é apenas teoricamente simples. imagine-se o trabalho que daria determinar o número de 20-ominós.

Uma questão diferente, e muito mais difícil, é achar uma fórmula que dê, para cada n, o numero de n-ominós. Tanto quanto sei, nunca ninguém conseguiu encontrar uma tal fórmula.

Há uma enorme bibliografia sobre os poliominós, sobretudo dentro da Matemática Recreativa (o Journal of Recreational Mathematics é uma fonte inesgotável). Estudam-se questões de todos os géneros. Uma das mais populares tem a ver com a construção de figuras planas usando poliominós. Um exemplo é construir rectângulos com n-ominós para um n dado. Só sobre este último tipo de problema há numerosos trabalhos.

Outro interessante tipo de questões refere-se à pavimentação ou cobertura (paving, packing ou tiling de figuras planas usando n-ominós. Mesmo com n=1, ou seja, usando quadrados, conceber a pavimentação mais eficaz de uma figura, isto é, a pavimentação que deixa menos espaço descoberto - mas mantendo os quadrados dentro da figura -, pode ser uma tarefa altamente complicada (a menos que a figura seja muito simples, digamos rectangular com lados múltiplos do lado dos quadrados que se estão a utilizar).

Os poliominós tornam-se ainda mais atraentes, até para os jovens, porque se prestam a experiências concretas: basta recortá-los em papel ou cartão e começar a tentar encaixá-los de uma forma ou de outra.

Em 1986, um investigador soviético, Alexei Pajitnov. concebeu um jogo baseado precisamente na ideia de encaixar poliominós uns nos outros. No jogo só aparecem tetrominós, e daí o seu nome: Tetris. Programado por um jovem estudante de 18 anos, Vadim Gerasimov, o Tetris é muito simples de descrever: A meio do écran está um rectângulo 10 x 20. Do topo do rectângulo vão caindo tetrominós ao acaso, um de cada vez (cada tetrominó só aparece quando o anterior já pousou). Usando certas teclas, o jogador pode rodar o tetrominó, bem como deslocá-lo para a esquerda ou para a direita, mas apenas enquanto ele está a cair. Cada vez que uma qualquer linha horizontal (com dez quadrados) fica completamente cheia, desaparece, e o jogador marca pontos (também se marcam alguns pontos por cada tetrominó que cai). A velocidade a que caem os tetrominós depende do nível em que se está. Há dez níveis, de 0 a 9. O jogador escolhe o nível a que quer começar, e depois, à medida que a pontuação sobe, o nível vai subindo automaticamente. O jogo acaba quando a pilha de tetrominós atinge o topo do rectângulo (ou, por outras palavras, quando o número de linhas incompletas chega a 20). O principal objectivo do jogador é adiar o mais possível o fim do jogo.

Um écrân típico do Macintosh. O jogado ainda não conseguiu completar nenhuma linha,
como se vê no quadro em cima à direita. Notem-se os "buracos" nas várias linhas.

Apesar da sua simplicidade, o Tetris é um jogo de estratégia que exige capacidade de previsão e de decisão rápida. Se a pilha de linhas incompletas começa a ficar muito alta, tem-se menos tempo para decidir onde colocar o próximo tetrominó. Nos níveis mais elevados a velocidade de queda é tal que o desastre é inevitável a curto prazo - no nível 9 ninguém resiste mais que alguns segundos (dá vontade de desistir e abrir um guarda-chuva).

O valor educativo do Tetris é duvidoso. Os seus méritos não estão aí, mas sim no fascínio imediato que exerce sobre quem o joga. A primeira vez acha-se interessante. A segunda já os sete tetrominós são mais familiares, e quando o jogo acaba fica-se com a sensação de que se podia ter feito muito melhor. À décima vez está-se irremediavelmente perdido. Já não se pensa noutra coisa senão em tentar outra vez e melhorar a pontuação (o jogo regista as vinte melhores). De entretenimento o Tetris transforma-se num desafio e mesmo num vício.

Resumindo: Se quiser chegar atrasado a encontros ou reuniões, se quiser preparar as aulas sempre à última hora, se quiser deixar de falar com amigos e familiares (sobre todos os assuntos menos um), se, de um modo geral, quiser deixar para depois de amanhã o que tinha de fazer ontem, e se, ainda por cima, quiser estragar a vista (que é o que se consegue ao manter os olhos cravados num écran minutos a fio), então dedique-se ao Tetris. É um jogo genial.

João Filipe Queiró

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
voltar frente
[ Início do Número 16] [ Menu Principal ]