Prefácio a “Telemóveis na sala de aula:
sim ou não?”
Porto, Edulog, 2018
Telemóvel
na sala de aula: sim ou não? A pergunta tem muitos
destinatários possíveis, com
níveis de responsabilidade variados: os alunos, os pais,
os professores, os autores
de regulamentos escolares, os directores de escola ou
agrupamento, os
legisladores, a sociedade em geral.
A
pergunta é colocada pela realidade: os telemóveis –
entendidos como os modernos
smartphones – são hoje objectos de uso generalizado, em
particular pelos jovens
em idade escolar, que em muitos casos têm dificuldade em
separar-se deles.
Trata-se
de uma tecnologia poderosa. Levar um dispositivo destes
para a sala de aula é o
mesmo que colocar, sobre a mesa, telefone, leitor e
gravador de áudio, leitor e
gravador de vídeo, máquina fotográfica, câmara de filmar,
jogos de vídeo, jogos
de tabuleiro, baralho de cartas, televisão, rádio,
jornais, dicionário,
enciclopédia, atlas e, last but not least, um aparelho que
permite a
comunicação pessoal permanente e instantânea por vários
canais. Percebe-se a
dimensão do problema que está posto.
Colocar
a pergunta não é presumir a resposta. O problema é
genuíno. Os argumentos
alinham-se em vários sentidos.
Por
um lado, reconhece-se que é difícil gerir uma realidade
que quase se impõe de
fora, sendo preferível uma adaptação da escola a tal
realidade, indo à procura
de possíveis usos pedagógicos dos telemóveis. Esta posição
está em geral
associada a contextos de autoridade escassa nos
estabelecimentos escolares, em
que qualquer intervenção restritiva é vista como
impossível. Uma variante, num
registo positivo, consiste em admitir que há uma nova
ferramenta disponível e
que existem situações em que os novos dispositivos podem
desempenhar um papel
como recursos adicionais de apoio à aprendizagem.
Outros
reagem de forma dura, propugnando a interdição completa
dos telemóveis na sala
de aula, pelos seus efeitos destruidores da atenção e da
concentração, sem as
quais não há aprendizagem possível, e afirmando que os
smartphones não
acrescentam nada de importante – pelo contrário – ao
cumprimento da missão
educativa da escola.
Estes
argumentos não pretendem intervir na questão diferente,
suscitada em vários
estudos, dos efeitos psicológicos – que podem chegar à
alienação e à depressão
– que o uso das plataformas de comunicação instaladas nos
telemóveis,
potencialmente viciantes, pode ter sobre os adolescentes.
Voltando
à sala de aula, as dúvidas operacionais são muitas. E se
nem todos os alunos
possuírem um smartphone? Será preferível apontar para o
uso de tablets
pertencentes à escola? Poderia o seu uso ser apenas
parcial, fosse por
restrições de software fosse por embargos na própria rede
de comunicação?
Conseguirá manter-se a distinção crucial entre
conhecimento e informação, entre
aprendizagem e recepção acrítica?
Fevereiro
de 2018
João
Filipe Queiró
Professor
da Universidade de
Coimbra,
membro
do Conselho Consultivo do
Edulog