posição dos departamentos de matemática das universidades públicas portuguesas sobre uma proposta de alteração à lei de bases do sistema educativo

Os Departamentos de Matemática das Universidades públicas portuguesas abaixo identificados manifestam a sua discordância relativamente à anunciada proposta de alteração da Lei de Bases do Sistema Educativo que permitiria às Escolas Superiores de Educação formar professores para os 7(o), 8(o) e 9(o) anos de escolaridade.

Esta posição dos Departamentos de Matemática não se baseia numa reacção de tipo corporativo, sendo tomada na convicção de que nos cabe uma enorme responsabilidade na formação dos jovens portugueses.

De facto, a Matemática é uma disciplina central na formação científica e cultural; é mesmo uma área de formação recentemente reconhecida como estratégica pelo Ministério da Educação. A sua aprendizagem exige muitos anos de estudo metódico e disciplinado, com um ensino competente e cientificamente seguro. Só docentes com uma rigorosa formação científica estão à altura desta tarefa.

Esta preocupação em relação à qualidade do ensino em geral, e da Matemática em particular, têm-na os promotores da avaliação das Universidades públicas, avaliação essa que em muitos casos já decorreu e (como no caso das licenciaturas em Matemática) está a decorrer. Neste contexto, pareceria obrigatório, antes de admitir entregar às Escolas Superiores de Educação a tarefa, entre todas delicada, e essencial para o futuro do País, de formar os professores de anos tão adiantados como os 7(o), 8(o) e 9(o), analisar cuidadosamente o seu corpo docente. Quem são os docentes das Escolas Superiores de Educação, que graus têm, onde os obtiveram, em que áreas, com que notas, com que júris? Quantos docentes das Escolas Superiores de Educação em Portugal possuem qualificações mesmo que só a nível de mestrado no domínio específico da Matemática (e não em áreas como "Ensino da Matemática")? Que matérias constituem os planos de curso das Escolas Superiores de Educação? E, se se pretendesse alargar as responsabilidades dos seus docentes, quais as consequências que daí adviriam em termos de exigência na carreira docente das Escolas Superiores de Educação? Estas interrogações não podem ser ignoradas, e devem aliás ser colocadas em relação a todas as instituições que em Portugal fazem formação de professores de Matemática do 7(o) ano em diante. Das respostas a elas só poderá tirar-se uma conclusão: a formação dos professores dos 7(o), 8(o) e 9(o) anos de escolaridade tem que ser competência das Universidades.

Dir-se-á que a proposta de alteração à Lei de Bases do Sistema Educativo tem o cuidado de referir que as Escolas Superiores de Educação terão de satisfazer certos "requisitos", de forma a garantir o "nível científico" da formação dos professores. Ora, dadas as características do corpo docente de que dispõem actualmente aquelas instituições, a lei sobretudo uma lei neste domínio deveria seguir-se à realidade, e não pretender antecipar-se a uma realidade que não existe, e só muito dificilmente se enxerga que possa vir a existir.

Num momento em que de todos os lados se ouvem críticas à insuficiente preparação matemática de muitos dos candidatos à frequência do ensino superior, causa-nos a maior perplexidade tomar conhecimento de que o Ministério da Educação, sem uma palavra às Universidades (nomeadamente apresentando críticas ao modelo de formação existente, que agora com certeza deseja ver extinto), propõe uma medida que terá como resultado baixar drasticamente o nível científico da formação dos professores dos 7(o), 8(o) e 9(o) anos, em particular dos professores de Matemática. Não se pode aceitar que, pelo facto de a escolaridade ser obrigatória até ao 9(o) ano, se proceda como se o ensino verdadeiramente exigente começasse apenas no 10(o) ano, olhando para os 10(o), 11(o) e 12(o) anos como um ciclo escolar em que se vão colmatar as insuficiências dos anos anteriores.

Os Departamentos de Matemática portugueses apelam ao Governo para que retire esta proposta de lei e chamam a atenção do Parlamento e da opinião pública para a gravidade do problema. O progresso cultural, científico e tecnológico do País exige uma enorme atenção ao ensino dos jovens, e não se compadece com erros graves como o traduzido nesta proposta.

Julho de 1996

Departamento de Matemática da Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade de Coimbra
Departamento de Matemática da Faculdade de Ciências, Universidade de Lisboa
Departamento de Estatística e Investigação Operacional da Universidade de Lisboa
Departamento de Matemática Pura da Faculdade de Ciências, Universidade do Porto
Departamento de Matemática Aplicada da Faculdade de Ciências, Universidade do Porto
Departamento de Matemática do Instituto Superior Técnico, Universidade Técnica de Lisboa
Departamento de Matemática, Universidade de Évora
Departamento de Matemática da Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Nova de Lisboa
Departamento de Matemática da Escola de Ciências, Universidade do Minho
Departamento de Matemática, Universidade de Aveiro
Departamento de Matemática, Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro
Departamento de Matemática/Informática, Universidade da Beira Interior
Departamento de Matemática, Universidade dos Açores


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