Pseudaria (1)

Infelizmente, muitos livros escritos pelos antigos sábios gregos perderam-se. Antes da invenção da imprensa por Gutenberg no séc XV, os livros circulavam através de cópias manuscritas (principalmente pergaminhos e papiros) pelo que poucos exemplares existiam, e além disso eram bastante frágeis. Muitas guerras, cataclismos e pilhagens se encarregaram da destruição dos livros; só na célebre biblioteca de Alexandria no Egipto entre o séc III a.C. e o séc. IX terão existido mais de 700 000 volumes que foram destruídos em sucessivas invasões, até nada restar deles.

Euclides escreveu mais livros além dos célebres "Elementos". Infelizmente, vários desses livros se perderam. Um desses livros chamava-se "Pseudaria", isto é, Livro de Falácias , segundo Proclus e Pseudographemata segundo Ephesius.

Existe uma descrição deste livro dada por Proclus:

"Atendendo a que muitas coisas, embora parecendo repousar sobre a verdade e seguir princípios científicos, realmente tendem a desviar-nos dos princípios e enganar as mentes mais superficiais, ele elaborou métodos também para a compreensão discriminativa destas coisas, pelo uso dos quais métodos seremos capazes de dar aos principiantes no seu estudo prática na descoberta de paralogismos, e evitar sermos nós próprios enganados. O tratado pelo qual pelo qual ele põe esta maquinaria nas nossas mãos é o livro que intitulou Pseudaria , enumerando por ordem os vários tipos, exercitando a nossa inteligência em cada caso com teoremas de todas as espécies, colocando o verdadeiro ao lado do falso, combinando a refutação do erro com ilustrações práticas. Este livro então tem a intenção de ser catártico e exercitar, enquanto que os Elementos contêm o guia irrefutável e completo para a investigação científica real dos assuntos da Geometria."

Não é possível saber que tipo de problemas apareciam nesse livro nem qual o tipo de classificação efectuada por Euclides. Mas há vários problemas de geometria que podem facilmente ser mal resolvidos originando conclusões falsas mais ou menos hilariantes. Esses exemplos podem ser usados no espírito de Euclides, como fomentadores do espírito crítico de quem os analise. Nessa ordem de ideias passaremos a apresentar no "Jornal de Mathematica Elementar" uma série de problemas de geometria que poderiam perfeitamente ter figurado no Pseudaria de Euclides. Mas, para atingir plenamente os objectivos enunciados por Euclides, não indicaremos a solução dos problemas no mesmo número do Jornal de Mathematica Elementar . Daremos um prazo de um mês para os leitores interessados pensarem nos problemas e nos enviarem soluções e observações; dentre essas soluções seleccionaremos as mais interessantes para publicar. Atendendo à antecedência com que os textos devem ser escritos, as soluções dos problemas de hoje serão publicados daqui a dois meses. Agradecemos também que nos enviem outras observações que julgarem pertinentes sobre esta série de problemas.


Falácia 1

Consideremos duas circunferências de raios desiguais que se intersectam nos pontos Q e R.

Tracemos os diâmetros [PQ] e [QS] de cada uma das circunferências. Tracemos o segmento [PS] e sejam M e N os pontos de intersecção com cada uma das circunferências. O triângulo [PNQ] está inscrito na semicircunferência PRQ; assim é rectângulo em N. Também o triângulo [SMQ] está inscrito na semicircunferência SRQ e é também rectângulo em M. Assim, temos dois segmentos [QM] e [QN] perpendiculares a [PS]. Logo, pelo ponto Q passam duas perpendiculares ao segmento [PS] .


Falácia 2

Conideremos um triângulo [ABC] qualquer. Sejam D, E e F os pontos médios dos lados. Tracemos os segmentos DF e FE. Temos que

,

Assim, o comprimento da linha quebrada ABC é igual ao comprimento da linha quebrada ADFEC. Tracemos agora os pontos médios G, H e I do triângulo [ADF] e os pontos médios J, K e L do triângulo [FEC]. Usando o mesmo raciocínio que anteriormente podemos provar que o comprimento da linha quebrada ADFEC é igual ao comprimento da linha quebrada AGHIFJKLC.

Continuando indefinidamente este raciocínio, vamos obter linhas quebradas cujo comprimento é sempre o da linha quebrada ABC, ou seja, . Mas as linhas quebradas que obtemos vão estando cada vez mais próximas do lado AC do triângulo. No limite confundir-se-ão com esse lado. Assim, será . Isto é, a soma das medidas de dois lados de um triângulo qualquer é igual à medida do terceiro lado .


Endereços para o envio de soluções:
endereço postal:
Departamento de Matemática
Universidade de Coimbra
Apartado 3008
3000 Coimbra
endereço electrónico: jaimecs@mat.uc.pt
endereço na WEB: http://www.mat.uc.pt/~jaimecs/pseud/resp.html


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