O PROCESSO DE AVALIAÇÃO DE 1999

 

 

Irene Fonseca

Center for Nonlinear Analysis, Carnegie Mellon University

Department of Mathematics, Carnegie Mellon University

 

 

Gostaria de começar agradecendo o convite que me foi feito para participar neste encontro.

Para falar do processo de avaliação, é necessário pôr em perspectiva os parâmetros que regeram o painel quando do processo de avaliação, isto porque, o painel foi constituído por investigadores que trabalham no estrangeiro, e portanto os critérios adoptados foram critérios internacionais.

A minha apresentação será organizada da seguinte forma: primeiro, gostaria de dar uma visão global de onde é que estamos e para onde vamos, em particular no que respeita aos desafios que a matemática enfrenta neste momento. Há necessidade da inovação matemática ser, não só neste país, como em qualquer parte do mundo, motivada em parte por motores industriais e tecnológicos e que a matemática terá que seguir de perto, ou perderá este momento de oportunidade. Este fórum oferece um espaço ideal para esta discussão.

A seguir, gostaria de falar, muito brevemente, da interface entre a matemática, a indústria e a tecnologia. E digo falar "brevemente" porque em Portugal ainda há muito pouco para falar sobre este assunto. O envolvimento actual da matemática com a indústria e a tecnologia portuguesas reduz-se a alguns casos pontuais, em particular nas áreas de investigação operacional e estatística. Em Portugal, se bem que em pequena escala, há projectos com a indústria nas telecomunicações, em controle, nas ciências médicas, na biologia, em transportes, na energia.

Falarei também um pouco sobre a matemática relativamente ao público em geral, mas não me alargarei visto que a apresentação do Nuno Crato incide sobre esta questão.

Finalmente, vou abordar a situação da investigação em matemática em Portugal, vista através da apreciação do painel de avaliação que decorreu em Julho de 1999. Começarei pelo processo em si, por considerações de ordem geral, depois falarei de áreas que têm, neste momento, visibilidade, maturidade científica e massa crítica estabelecida. Farei, depois, alguns apontamentos sobre áreas que necessitam de investimentos mais dirigidos, mais específicos; aqui não entrarei em grandes detalhes visto que o relatório final e os relatórios por unidades estão para sair brevemente.

Quero começar, bem entendido, por fazer o apelo ao Ministério da Ciência e Tecnologia, à Fundação para a Ciência e Tecnologia, para que o financiamento que tem sido dado à investigação, e em particular à investigação matemática em Portugal, seja mantido, seja aumentado. Estou convencida que esse é um factor dominante e decisivo que está por detrás do extraordinário desenvolvimento e avanço que a disciplina sofreu nos últimos anos. Actualmente a maior parte do financiamento para a matemática em Portugal é governamental, e indiscutivelmente há poucos investimentos governamentais que possam criar conjuntamente mais empregos, mais riqueza do ponto de vista de aumento de standards de vida, que tenham mais impacto na saúde, nas telecomunicações, nas políticas bancárias de financiamento, na educação, na protecção do ambiente, do que esta aposta e apoio à comunidade de investigadores matemáticos neste país.

Por detrás do impacto da matemática neste leque de outras áreas de vida do dia a dia, está o desenvolvimento da computação científica: este é um tema que vai repetir-se ao longo da minha apresentação. Portugal está muito, muito aquém dos níveis ditos europeus no campo da matemática computacional: esta questão terá que ser enfrentada de forma sistemática.

A matemática não pode perder a oportunidade de participar no futuro que nos aguarda. Aqui eu quero avançar com prudência: não quero dizer com isto que vamos todos começar a fazer matemática aplicada, que a matemática terá de ser toda conduzida e dirigida ao consumidor, no sentido de participar directamente e colectivamente nos programas de que falarei brevemente. Não, de todo, é essencial manter, investir e fomentar a investigação básica fundamental, investindo igualmente no que está para além dos nossos muros e para além dos nossos muros estão a computação, o quantum computing, as nanotecnologias e as biotecnologias (técnicas que permitem construir instrumentos do tamanho de uma molécula). Desenvolvimentos recentes na área das equações com derivadas parciais têm permitido o aperfeiçoamento de desenhos de instrumentação para cirurgia não evasiva, de forma a que com instrumentos com o tamanho, digamos, de um décimo do cabelo humano se possa fazer investigação cardiovascular não evasiva. A matemática tem um papel privilegiado a desempenhar no desenho de instrumentos de segurança mais pequenos que um grão de pó, nas comunicações, na biologia, no estudo do DNA, na ressonância magnética, etc.. Com novos problemas vêm novos desafios que trazem consigo novas oportunidades, e há que ter uma visão científica com base num planeamento estratégico para poder explorar estas mesmas oportunidades.

Não vai ser por acaso que os matemáticos portugueses poderão colaborar nessas iniciativas. Já discutimos que é um problema de tempo, já discutimos que os investigadores (académicos) portugueses estão sobrecarregadíssimos relativamente à carga de ensino, com pouco tempo disponível para se dedicarem aos projectos que lhes oferecem mais garantia e continuidade de programas de investigação, quanto mais para se poderem dedicar a áreas novas. As áreas novas exigem imenso tempo, imensa dedicação, correndo o "risco" de um nível fraco de indicadores de produtividade no início desta investigação. Há quatro ingredientes fundamentais para que possamos entrar nestas novas vias: tempo, excelência nacional em áreas de especialização periféricas da área a introduzir (não podemos ser bons em tudo, mas podemos ser bons em algumas coisas; Portugal é um país pequeno, terá, portanto que haver uma identificação das áreas onde poderá haver o tal impacto nas outras disciplinas), financiamento e investimento para investigação a longo termo e com objectivos a longo prazo e, finalmente, capacidade de diálogo entre disciplinas. Gostaria, mais uma vez, de frisar a necessidade da ciência quantitativa (da matemática quantitativa) que abrange uma hierarquia enorme de fenómenos, desde o nano ao micro ao meso ao macro nas energias, nas engenharias, na comunicação, nas biologias, e em variadíssimas outras disciplinas onde há problemas de escalas múltiplas. Os problemas de escalas múltiplas devem ser prioritários e exigem um leque de colaboração de esforços vastíssimo, desde as matemáticas discretas às equações diferenciais, geometrias e computação e, bem entendido, explorando pontes com cientistas de outras disciplinas. A matemática tem tido bastante impacto nos materiais ditos inteligentes. Entra a análise numérica, entram as equações com derivadas parciais, equações diferenciais ordinárias, sistemas dinâmicos, computação. Ondas e scaterring desempenham um papel fundamental na biologia molecular, assim como equações com derivadas parciais, matemática discreta, combinatória. Em segmentação de imagem na robótica há controle, há análise de Fourier. Na economia há estocástica, matemática financeira, equações com derivadas parciais, optimização. Na criptografia há combinatória, e a lista continua.

As palavras-chave são multidisciplinaridade e interdisciplinaridade. Incentivos para que estas venham a ser realidade na matemática que se faz em Portugal, incluem revisão dos critérios de promoções e de distribuição de carga lectiva e administrativa, e incentivos para haver doutoramentos e pós-doutoramentos em (co-)tutela com a indústria. Mais uma vez, há alguns casos pontuais onde esta opção já foi implementada, principalmente na investigação operacional e na estatística, mas o envolvimento dos estudantes de licenciatura na investigação (a chamada "integração vertical") é, neste momento, inexistente em Portugal. Em muitos países a transição para as novas áreas da matemática está a ser feita de forma mais ou menos natural devido ao facto do financiamento de projectos vir, em parte, da indústria, da tecnologia. Estes projectos para serem viáveis têm que incorporar o contacto com outras disciplinas e o diálogo com outros cientistas. Atendendo a que em Portugal, actualmente, isto ainda não é uma realidade, e o financiamento da investigação em matemática vem na sua quase totalidade da Fundação para a Ciência e Tecnologia, quais são os motores que irão fazer com que os matemáticos portugueses se abram a estas novas oportunidades? Cabe, portanto, à Fundação a responsabilidade de encorajar estas interacções e de fomentar a criação de redes interdisciplinares.

Em resumo atravessamos um período de progresso muito rápido, há que olhar para o curriculum de forma mais alargada, não perdendo o equilíbrio e o rigor, mas com a visão dos desafios que se impõem à disciplina. Não é preciso "inventar a roda", há modelos que têm sido adoptados com sucesso, e aqui, o papel dos investigadores no desenho do curriculum é fundamental. É muito difícil, senão impossível, dissociar o investigador do educador: é da responsabilidade do investigador participar no desenho do curriculum, antevendo as novas oportunidades de saída dos licenciados.

Neste momento, atravessamos um período crítico, com a grande maioria dos recém-licenciados a serem integrados de forma mais ou menos sistemática no sistema universitário. Esta situação oferece as suas vantagens: evidentemente é gratificante saber-se que se tem o emprego garantido. Mas tem também imensos problemas: é extremamente difícil julgar e decidir imediatamente após a conclusão da licenciatura, se esse indivíduo tem ou não tem capacidade de investigação. Nem todos os licenciados em matemática "têm que ser" investigadores. Esta absorção, mais ou menos automática, no sistema académico é fatal. É fatal não para a pessoa que obteve o emprego, mas para o sistema propriamente dito, visto que bloqueia completamente a possibilidade de recrutamento dirigido e, inclusivamente, de planeamento estratégico. É impossível fazer planeamento estratégico sem possibilidade de recrutamento exterior.

É necessário criar outras saídas para os licenciados em matemática para além da académica. Não é necessário tirar cursos que existem para criar outros, mas a criação de cursos com saída mais directa relativamente à industria e tecnologia ("matemática industrial") poderia ser contemplada. O desenvolvimento que tem tido lugar na indústria e tecnologia nos últimos, digamos, 20 anos, tem sido galopante e resultou num alargamento do fosso, já existente, entre o mundo académico (a matemática que se faz nas universidades e centros) e o que se passa no mundo real dos laboratórios. Isto não é um fenómeno português, é um fenómeno universal. Há, portanto, a necessidade de fazer a ponte e quem terá que a fazer são os matemáticos, não são os engenheiros. Os engenheiros podem muito bem viver sem nós, isso é um facto. Os engenheiros conduzem o barco da inovação e os matemáticos só estarão entre os passageiros se trabalharem para isso! Há que repensar a matemática, não em detrimento do que existe, mas acrescentando ao que existe. A ciência aplicada requer uma maneira nova de repensar a dualidade ciência-produto e que passa pela interdisciplinaridade, pelo planeamento da investigação. O planeamento da investigação não diminui o valor devido da matemática dita fundamental ou básica, mas em acréscimo daquilo que existe, oferece uma forma inovadora de olhar para aquilo que temos e de saber utilizar aquilo de que dispomos.

Uma divulgação sistemática, educada e informativa da actividade científica na área da matemática requer mecanismos, alguns dos quais indicados no relatório final do painel de Julho de 1999. Como é que se pode tornar a matemática mais atractiva para os mais jovens? Um fenómeno que ocorre em Portugal tal como no resto do mundo é que os jovens brilhantes na área da matemática não seguem a matemática, mas sim a engenharia, a ciência dos computadores. Porquê? Ao longo das avaliações só houve uma área onde não se queixaram da falta de estudantes de pós-graduação que foi a álgebra. Portanto, os algebristas estão a fazer qualquer coisa acertada a nível de recrutamento. O quê exactamente, não sei. Aqui há uma lição a aprender e qualquer coisa a discutir porque os números da análise estão a decrescer vertiginosamente e os números da álgebra são bastante sólidos e estáveis. Este não é um fenómeno localizado geograficamente no país, é um fenómeno da área.

A relação da matemática com o público e com o multimedia e o fomentar da atracção dos alunos pela matemática não começa a nível da Universidade, começa antes. A educação matemática deve começar bem antes, deve começar a nível dos liceus ou, talvez, até mesmo a nível primário. Tem que haver envolvimento dos investigadores nessa fase da educação. Programas de "outreach" para aliciar alunos dotados do liceu para a matemática são iniciativas relativamente simples de pôr em prática, como por exemplo organizar institutos de Verão (creio que o Instituto Superior Técnico tem iniciativas neste sentido): nos institutos de Verão, alunos dotados do liceu trabalham em programas de projectos de investigação simples e são expostos a áreas contemporâneas de actividade matemática.

Quanto às avaliações de Julho de 1999, gostaria de avançar com uma nota extremamente positiva: o painel ficou impressionado com o nível de investigação matemática que se faz em Portugal, o geral não sendo uniforme, põe em destaque centros onde há visibilidade internacional estabelecida. Há depois um certo número de centros de dimensões mais pequenas onde se faz trabalho de muita qualidade, com imenso valor e, muitas vezes, em condições difíceis.

A condução das visitas foi mais ou menos sistemática: o líder da unidade começou por apresentar a sua unidade, falou brevemente das actividades que decorreram nos últimos três anos desde 1996 até 1999, e seguidamente o painel convidou alguns dos investigadores, principalmente os mais novos, a partilharem com o painel resultados obtidos durante esse período e que eles achassem relevantes. A maioria das unidades reagiu muito bem a esta abordagem e este diálogo provou ser extremamente útil para a apreciação do painel. Nalgumas unidades ainda houve a tendência de ler ponto por ponto o relatório escrito, mas esta não é a forma mais expedita de aproveitar a experiência científica do painel de peritos. Os peritos estrangeiros têm acesso à documentação escrita antes das visitas se iniciarem, e estas servem para se conhecer os investigadores, discutir, falar e estabelecer um diálogo.

O Painel constatou que muitas das recomendações de 1996 foram implementadas, e outras não foram seguidas, o que é natural visto que as recomendações têm que ser tomadas simplesmente como tal, e cabe aos próprios investigadores decidir ao nível dos centros se de facto haverá reestruturação interna da unidade, realinhamento dos interesses da investigação, etc.. Gostaria de salientar dois exemplos onde recomendações de realinhamento de actividade científica foram acatados: o investimento em álgebra computacional no Centro de Álgebra da Universidade de Lisboa, e o renascimento da estatística em Aveiro. Em 1996 a estatística era praticamente inexistente na Universidade de Aveiro: tinha existido e tinha deixado de existir. É espantoso o que conseguiram fazer em três anos. Estes são exemplos pontuais e como estes há muitos mais.

O nível de actividade científica é extraordinário, comprovado pelas organizações de escolas de Verão, conferências, workshops, que além de contribuírem com o seu valor intrínseco para a formação de quadros académicos, têm um impacto significativo na visibilidade de Portugal lá fora. Aqui também gostaria de salientar o papel do CIM, Centro Internacional de Matemática, o qual foi mencionado frequentemente ao longo das visitas, como sendo uma presença importante na actividade complementar dos centros.

A impressão geral é muito positiva, e o melhor testemunho do estado saudável da actual actividade científica em Portugal é o facto de que a percentagem de retorno é enorme, assim como foi referido hoje de manhã pelo Senhor Ministro Mariano Gago.

Há mesmo instituições onde a formação lá fora e o recrutamento de novos doutorados estão a ser feitos de forma exponencial. Mas, se bem que seja gratificante para os jovens que estão lá fora saberem que têm emprego garantido quando voltam, é preocupante constatar que ser-se afiliado com uma universidade é condição suficiente para se ser membro dalgum centro. Esta situação acarreta consequências negativas, já que as prioridades da investigação e onde é que é preciso investir, raramente desempenham algum papel no processo de recrutamento. Há centros onde o recrutamento planeado já começa a acontecer, mas são centros com grande autonomia, geralmente nas grandes cidades. O planeamento em áreas estratégicas, para onde é que se vai, para onde é que se deve ir e porque é que se deve ir, é dificultado pelo "inbreeding", que poderá ser parcialmente aliviado incentivando os estudantes a fazerem os doutoramentos noutras instituições, lá fora, e encorajando a mobilidade a nível de pós-doutoramento. Há, e deve haver, lugar para os doutoramentos que se fazem dentro e fora do País. É evidente que nem todos os centros têm maturidade ainda para assegurarem programas de doutoramento, mas há já alguns onde há essa capacidade. É importante, no entanto, que aqueles que fazem doutoramento no País tenham a oportunidade de irem lá para fora fazer um pós-doutoramento. Aqueles estudantes que vão para fora são um veículo fundamental no estabelecimento de pontes e contactos com o estrangeiro.

A dualidade ensino/investigação poderia ser francamente beneficiada com uma distribuição de serviço ajuizada. O que é que eu quero dizer com isto? O que eu quero dizer é que todos nós sabemos que os investigadores têm uma curva cuja derivada é negativa a partir duma certa idade; é um facto, é humano. O desaproveitamento dos recursos humanos e científicos actualmente em Portugal está patente na situação dos jovens recentemente doutorados que vêm cheios de energia, com um "momentum" a não desperdiçar, e a quem lhe são exigidas as mesmas horas de ensino que a um professor já quase jubilado e que não faz investigação. Esse professor, provavelmente, teria muito gosto em dar mais três horas de aulas e participar de forma mais activa na administração da instituição e que não lhe fosse pedido fazer uma coisa que ele não tem mais intenção de fazer, que é a investigação. Assim aqueles que têm estudantes de pós-graduação, bolseiros de pós-doutoramento e um programa de investigação activo, assim como jovens recém-doutorados, teriam uma carga lectiva horária mais reduzida. Este critério tem sido implementado com sucesso em muitas instituições, e.g. aquela a que pertenço, a Carnegie Mellon University, e que se baseia na forma de valorizar o trabalho de cada um, dentro da autonomia universitária.

Ao falar das áreas que foram identificadas como áreas com visibilidade estabelecida, gostaria de frisar que esta lista não é exaustiva no sentido em que há actividade de muito valor que não é incluída nesta lista por falta de maturidade e/ou massa crítica. As áreas que sobressaíram com maior visibilidade são, não necessariamente por esta ordem, as equações com derivadas parciais (hiperbólicas, parabólicas, elípticas) em Lisboa e na Covilhã, sistemas dinâmicos e geometria no Porto e em Lisboa e álgebra multilinear e semi-grupos, também no Porto, em Coimbra, em Lisboa e no Minho, análise estocástica em Lisboa e na Madeira, e a estatística em Lisboa, Aveiro, Coimbra, Porto, e em Évora. Aqui queria fazer um pequeno parêntesis sobre a estatística que sofreu uma mudança radical aos olhos do painel desde 1996.

Há áreas com menos visibilidade, a chamada "core mathematics", como por exemplo a teoria dos números. Esta é uma questão que não me preocupa de todo, porque Portugal, sendo um país relativamente pequeno, não pode nem deve ter a veleidade de se representar em todas as áreas e todas as sub-disciplinas dentro da matemática.

A ausência quase completa da matemática computacional é um assunto de importância nacional. Há análise numérica de muito valor e com visibilidade internacional no Instituto Superior Técnico e em Coimbra, mas estes esforços ainda estão, de certo modo, desarticulados e falta-lhes uma componente computacional. Este é um problema complicado, grave e terá que ser resolvido e abordado não por um centro ou dois centros separadamente, mas sob uma acção concertada sob a alçada da FCT.

Para terminar gostaria de abordar a questão da necessidade de liderança corajosa. A nível dos centros este é ainda um conceito pouco percebido, já que até recentemente a liderança nos centros reduzia-se a uma rotina administrativa do dia-a-dia. A identificação de novas oportunidades, o constante desenvolvimento da visão científica da unidade exigem capacidade de manobra, poder de liderança, e uma grande dose de coragem. É evidente que a consulta com a unidade tem que se produzir regularmente, mas o motor das decisões recairá no director da unidade.

A carreira de investigador em matemática a tempo inteiro, "ad eternum", não tem sentido. Nas grandes potências aonde há iniciativas a nível nacional com incidência na energia, no ambiente, na defesa, na expansão espacial, etc., tem que haver investigadores que se dediquem a tempo inteiro à investigação, mas a grande percentagem do financiamento não é governamental, é através de "soft money". A tal curva de produtividade que falei atrás, diz-nos que a grande maioria dos investigadores têm as grandes ideias até aos 35 anos. Aos 50 anos deveriam estar inseridos na carreira académica também como educadores de modo a transmitirem aquilo que sabem aos estudantes. Seria muito útil, sim, haver a oportunidade de fazer investigação a tempo inteiro, mas temporariamente, por períodos de dois ou três anos. Há um projecto, há uma nova iniciativa, quer-se dedicar a uma nova área, o que requer um investimento de dois, três anos? Submete-se uma proposta de projecto, há um painel, é aceite, tem-se três anos para se dedicar a isso, mas depois volta-se novamente ao ensino e à investigação retomando-se a vida como outro académico qualquer.

Por último queria terminar a minha intervenção, apelando aos investigadores que se empenhem na educação e no desenvolvimento do curriculum pré-universitário. Só se pode colher aquilo que se semeia e não podemos esperar que sejam os professores do liceu, isoladamente, que vão instigar nos alunos o gosto pela matemática (investigação); este tem que ser um esforço conjunto com os próprios investigadores.