A PÓS-GRADUAÇÃO EM MATEMÁTICA

 

 

Jorge de Almeida

Centro de Matemática da Universidade do Porto

Departamento de Matemática da FCUP

 

 

A PÓS-GRADUAÇÃO EM MATEMÁTICA: ALGUMAS REFLEXÕES

 

 

Antes de mais gostaria de agradecer o convite que os organizadores deste debate gentilmente me dirigiram. Desde logo manifestei que não me parecia ser a pessoa mais adequada para falar sobre esta questão mas acabei por ser convencido de que, face aos contactos directos com experiências de pós-graduação que já tive em seis países diferentes, talvez pudesse ter algo de interesse a dizer-vos.

Uma vez que ocupo cargos com alguma representatividade em duas instituições, é importante em seguida salientar que as opiniões que aqui exprimo representam-me somente a mim próprio e em nada comprometem as posições oficiais daquelas instituições.

Passados os preliminares, considero aqui a pós-graduação como formação avançada constituída por diversas componentes:

  1. cursos breves em escolas (habitualmente entre nós ditas de Verão)
  2. cursos de reciclagem e actualização
  3. mestrado
  4. doutoramento

Farei em seguida algumas referências breves aos três primeiros tipos de pós-graduação, debruçando-me mais longamente sobre o tema dos doutoramentos.

Quanto aos cursos breves, tem havido entre nós numerosas escolas nos últimos tempos, sendo o CIM um dos promotores regulares de tais eventos. Faltam contudo porventura as escolas de carácter mais genérico com um leque alargado de cursos ao estilo dos Colóquios Brasileiros de Matemática e que a Sociedade Portuguesa de Matemática levou a cabo algumas vezes com um número reduzido de cursos mas cobrindo áreas variadas.

Quanto aos cursos de reciclagem, ocorrem-me as experiências tipo profissionalização em exercício e os cursos do programa FOCO, as quais, pelo menos em Matemática, certamente no primeiro caso e suponho que também no segundo caso, têm como público exclusivamente professores do ensino secundário. Suspeito que infelizmente muitas delas não têm a qualidade que seria de desejar.

É claro que conferências e escolas podem sempre ser consideradas como acções de reciclagem e actualização para investigadores e docentes do ensino superior mas creio que raramente funcionam como tal para pessoas que não sejam da área de especialidade dos eventos em causa. A todos os níveis, a baixa oferta disponível parece-me levar a um empobrecimento cultural da comunidade matemática portuguesa. Não teremos certamente enquanto país dimensão e capacidade para organizar um evento como o encontro Mathematical Challenges of the 21st Century promovido pela Sociedade Americana de Matemática na Universidade da Califórnia em Los Angeles em Agosto próximo, no qual 31 grandes estrelas da investigação apresentarão as suas perspectivas das suas áreas de especialidade para o próximo século. Mas penso que há espaço e apetência para realizações culturais com objectivos semelhantes.

Quanto aos mestrados, a oferta no nosso país hoje em dia é variada e encontra-se um pouco por toda a parte, desde as universidades públicas às privadas. O mercado nesta área recebeu um grande impulso com o aumento da procura por parte de docentes dos ensinos secundário e politécnico. Há sinais contudo de que o fenómeno de massificação deste tipo de ensino que parece estar a observar-se está a conduzir ao abaixamento da qualidade e à banalização do grau de mestre.

Pessoalmente tenho estado muito pouco envolvido neste tipo de ensino para além da orientação de algumas teses. Preferia que funcionassem mestrados com uma forte componente cultural alargada mas não sei se seria capaz de transformar esta preferência numa proposta concreta. A tendência actual e que também vi ser defendida neste debate é oferecer mestrados de especialização. Fica a impressão de que os cursos de mestrado oferecidos são muitas vezes o único meio dos docentes falarem daquilo que realmente lhes interessa, numa experiência frequentemente frustrada (e traumatizante para os alunos) pela incapacidade ou falta de motivação dos alunos para acompanharem as matérias leccionadas. Talvez com a criação de verdadeiros programas de doutoramento as tendências actuais possam ser corrigidas.

Finalmente, quanto aos doutoramentos, a oferta no nosso país limita-se, tanto quanto tenho conhecimento, à disponibilidade de alguns orientadores inseridos em escolas onde funcionam seminários regulares da especialidade. Os programas de doutoramento definem-se muito simplesmente pela preparação de uma tese sob supervisão com prazos que oscilam entre os 2 e os 6 anos1.

Tem havido um aumento sensível do número de doutoramentos nos últimos anos com uma tendência ligeira para predominância dos doutoramentos no país relativamente à equivalência de doutoramentos no estrangeiro. De acordo com os dados recolhidos na página web do Observatório das Ciências e das Tecnologias [1], com uma definição da área científica de Matemática que não é explicitada mas que inclui certamente a Estatística e alguma Computação, obtive o gráfico constante da Figura 1. Como os dados a que tive acesso só permitem avaliar a área de especialização pelo título da tese, que em alguns casos nem sequer está disponível, não me foi possível fazer mais do que uma estimativa do número de teses registadas como sendo de Matemática que se situam em áreas como a Estatística, a Computação, a Engenharia Geográfica e a Investigação Operacional (estas duas últimas com expressão muito baixa) num número que ascende a cerca de um terço do total.

 

 

Figura 1: Doutoramentos em Matemática de 1970 a 1998: equivalências versus doutoramentos no país (em tom mais claro).

 

A distribuição dos doutoramentos por universidades encontra-se muito desequilibrada, como seria de esperar face às diferentes fases de desenvolvimento em que as instituições se encontram. A Figura  apresenta a comparação em percentil dos contributos das diversas universidades.

 

 

 

1.

Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro: 1

2.

Universidade do Algarve: 1

3.

Universidade dos Açores: 2

4.

Universidade da Madeira: 2

5.

Universidade de Évora: 2

6.

Universidade do Minho: 7

7.

Universidade de Aveiro: 10

8.

Universidade do Porto: 13

9.

Universidade Nova de Lisboa: 20

10.

Universidade Técnica de Lisboa: 21

11.

Universidade de Coimbra: 38

12.

Universidade de Lisboa: 70


 

Figura 2: Doutoramentos em Matemática em Portugal de 1970 a 1998: comparação percentual dos contributos das universidades. Não houve doutoramentos nos anos 1973 a 1977. A penúltima coluna (T) representa os totais relativos para o período, também disponível na representação circular, enquanto a última coluna (C) se destina a facilitar a leitura pela identificação das cores. A listagem das universidades que concederam o grau de Doutor em Matemática, escrita na ordem correspondente à das colunas (T) e (C), indica também os totais absolutos para o período.

 

Não é claro em que medida estes dados são fiáveis uma vez que há casos de doutoramentos realizados numa universidade sendo o orientador principal de uma outra universidade, nacional ou estrangeira. Sobressai de qualquer forma uma concentração dos doutoramentos nas Universidades de Lisboa, de Coimbra, Técnica de Lisboa e Nova de Lisboa que, conjuntamente representam perto de 80% do total de doutoramentos realizados no país.

Comparando a evolução na Matemática com a verificada noutras ciências, obtemos a Figura 3. Enquanto, até aos anos 90, o comportamento médio das quatro áreas foi análogo, a Química e a Biologia parecem ter "disparado" nos últimos anos, ultrapassando os 40 doutoramentos por ano e chegando a Biologia a atingir os 59 doutoramentos em 1997. A Matemática destacou-se no ano de 1989 mas desde então, junto com a Física, tem vindo a perder terreno relativamente às outras ciências.

 

 

Figura 3: Evolução comparativa do número de doutoramentos em Portugal de 1970 a 1997 em algumas ciências exactas.

 

Embora não inteiramente fiáveis, estes são os dados objectivos a que tive acesso. Comparando com os dados publicados pela Sociedade Americana de Matemática nos seus Annual Surveys of the Mathematical Sciences [2], verificamos que ficamos muito aquém do que se regista nos EUA. Para uma população de cerca de 250 milhões de habitantes, foram completados no ano lectivo de 1998/99 um total de 1133 doutoramentos em Matemática (dados provisórios), número que fica abaixo em 30 do que se registou no ano anterior. Com os nossos 14 doutoramentos para 10 milhões de habitantes em 1998, não chegamos a atingir um terço dos valores percentuais dos EUA. Não sei se estão disponíveis dados de outros países europeus sobre esta matéria para eventual comparação.

Por outro lado, verificamos que nos EUA há uma percentagem significativa de doutorados em Matemática contratados por empresas (21,1% em 1998/99, dos quais 8,3% em Estatística, em queda do total de 28,7% em 1997/98). Não sei se os há mas não conheço um único doutor em Matemática que trabalhe em Portugal fora do mundo académico2. Aliás, tanto quanto sei, à excepção porventura das áreas da Estatística, da Computação, da Engenharia Geográfica e da Investigação Operacional, são nos últimos anos poucos os licenciados em Matemática e áreas afins que obtêm emprego em Portugal fora do ensino básico e secundário e do mundo académico.

Também em contraste com o que se passa nos EUA, embora não disponha de dados precisos sobre esta matéria, penso que a maioria dos doutorados em Matemática no nosso país ficam a trabalhar nos departamentos onde se doutoraram. Considero esta situação perniciosa ao desenvolvimento das nossas escolas de investigação que acabam por crescer demasiado por dentro nas áreas mais activas sem beneficiarem de interacções com outras escolas ao nível da formação dos seus investigadores. Noutros países considera-se útil exportar doutores que promovam a imagem da escola que os formou. Entre nós, suponho que, por os custos de formação não serem devidamente contabilizados e assacados a quem compete pagá-los, ainda se pensa que seria um desperdício enorme estar a formar doutores para depois os perder para outros países ou mesmo para outras instituições nacionais.

Frequentemente os nossos estudantes de doutoramento são assistentes nas próprias escolas na situação de equiparação a bolseiro, o que acarreta custos por duas vias: o pagamento dos seus vencimentos e a substituição do serviço docente que eles deixam de assegurar. O programa Prodep veio compensar as universidades pelo esforço na formação dos seus quadros realizada por essa via, permitindo a substituição temporária dos docentes doutorandos, mas não me parece que tenha contribuído para a desejada mobilidade dos quadros.

Mas, recuando um pouco, pergunto-me que mercado há em Portugal para verdadeiros programas de doutoramento. Se os cerca de 15 doutores por ano que actualmente "produzimos" tivessem todos cabimento em departamentos de Matemática, provavelmente teríamos mercado suficiente para duas ou três escolas de doutoramento de pequena dimensão. Mas, retirando a Estatística e a Computação, em muitas universidades já autonomizadas em departamentos próprios, não fica mercado para mais do que duas pequenas escolas de doutoramento.

O modelo de escolas que tenho em mente tem programas de doutoramento que incluem a frequência de cursos e a realização de exames de competência para além da elaboração e defesa de uma tese. Os doutorados terão portanto sido expostos a algo mais do que o contacto com um orientador e a sua escola numa área de especialização necessariamente restrita.

Poderíamos admitir que a existência de tais escolas iria levar muitos portugueses que presentemente partem para o estrangeiro para fazer o doutoramento a fazerem-no por cá e poderiam até as entidades financiadoras nacionais forçar essa situação pela redução do número de bolsas para doutoramento além-fronteiras. Como já aqui foi afirmado várias vezes, esse seria um erro grave por fechar um país pequeno em si mesmo e não me parece que haja hoje em dia quem defenda essa posição. Podemos pensar que a própria existência de tais escolas leve ao aparecimento de mais candidatos ao grau de doutor, mas duvido que o aumento da procura por essa via seja significativo.

Podemos também esperar e legitimamente desejar que a criação de tais escolas atraia mais estudantes estrangeiros. Penso que há algum potencial para que isso aconteça mas não nos podemos esquecer que entramos tarde num mercado altamente competitivo. Porventura no mundo lusófono as nossas chances de atrair as atenções são maiores, mas mesmo aí não podemos tomar esse mercado como um dado adquirido uma vez que o Brasil nos leva um avanço considerável. Em qualquer caso, de forma alguma defendo que desistamos à partida uma vez que não vai ser tarefa fácil. Somente há que ter consciência daquilo que nos espera e pesar bem os prós e os contras e optar por uma via que tenha boas chances de resultar.

Mas, não é verdade que as nossas universidades (públicas e privadas) e institutos politécnicos, carecem de quadros doutorados? De momento penso que ainda é de facto essa a situação que se verifica mas não sei se se manterá por muito tempo. O Conselho de Reitores já alertou para a previsível queda da procura do ensino superior nos próximos anos e há sinais de que a situação em Matemática vai ser fortemente agravada pela saturação dos quadros dos ensinos básico e secundário3. Os departamentos de Matemática, que maioritariamente se têm dedicado à formação de professores daqueles graus de ensino, deveriam entretanto encontrar outros mercados, seja na formação de matemáticos para outras saídas profissionais, seja na formação de pós-graduação. Se assim não fizerem e o quadro de previsões que acima apresentei se confirmar, tudo indica que a procura de doutores em Matemática no nosso país vá sofrer uma quebra considerável, quiçá aproximando-nos assim dos nossos parceiros europeus4 onde poucos são os doutores em Matemática que arranjam empregos académicos. Além do mais, como os fenómenos que descrevi tanto nos ensinos básico e secundário como no ensino superior se concentram numa geração, a substituição progressiva dos docentes que entretanto se vão reformando não vai ter expressão significativa a curto prazo.

Pode-se também desejar que a nossa sociedade evolua o suficiente para que as empresas se convençam da utilidade de contarem com doutores em Matemática nos seus quadros. Em países mais evoluídos isso já se verifica há muitos anos mas entre nós duvido que sequer haja muitos matemáticos que considerem que um doutor em Matemática tem cabimento fora do mundo académico. Mesmo ao nível dos licenciados em Matemática estamos ainda muito longe de ser capazes de nos convencermos a nós próprios e ao mercado fora do ensino da utilidade da contratação de matemáticos que não levem um rótulo tipo Estatística, Computação ou Matemática Aplicada.

Vem a propósito referir afirmações contidas num artigo de comparação da situação norte-americana com a que se verifica na Alemanha [3]. De acordo com uma citação atribuída a Friedrich Götze, da Universität Bielefeld, as oportunidades de emprego para diplomados em Matemática são "esplêndidas", acrescentando que "as empresas gostam dos matemáticos porque eles são flexíveis e espertos e não desistem com facilidade". Por outro lado, a propósito da criação de programas especializados em áreas como Matemática Financeira ou Engenharia Matemática, Rüdiger Verfürth, da Ruhr-Universität Bochum, afirma não enveredar por essa via "uma vez que a sua experiência indica que o mercado de emprego excelente que se abre aos seus diplomados é resultado da sua formação matemática alargada" enquanto Wolfgang Soergel, da Universität Freiburg, diz que "não devemos criar planos de estudo que restrinjam o que as pessoas são capazes de fazer em vez de lhes abrir as portas para novas possibilidades". Infelizmente entre nós os últimos anos têm registado, como caricaturou recentemente o Presidente Jorge Sampaio, a criação de cursos de fazedores de microfones...

Voltando à questão dos doutoramentos, recorro mais uma vez à comparação com os EUA, pela facilidade de acesso que tenho à informação sobre aquele país. Face aos dados de [2, Table 3A], verificamos que dos doutorados em 1998/99 empregados fora do mundo do ensino (empresas, institutos de investigação, governo), contam-se os seguintes números de doutores

  1. 13 em Álgebra e Teoria dos Números
  2. 13 em Análise (Real, Complexa, Funcional ou Hamónica)
  3. 14 em Geometria e Topologia
  4. 12 em Matemática Discreta, Combinatória, Lógica e Ciência da Computação
  5. 13 em Probabilidades
  6. 25 em Matemática Aplicada
  7. 26 em Análise Numérica e Teoria da Aproximação
  8. 19 em Equações Diferenciais, Integrais ou às Diferenças

 

Estes números parecem-me impressionantes. Não disponho de dados sobre a contratação (nos EUA) de doutorados no estrangeiro para os mesmos fins. Os números mostram desde logo como num país altamente desenvolvido há lugar para doutores nas diversas áreas da Matemática fora do mundo académico. Creio que estamos ainda longe de um tal estádio de desenvolvimento mas penso que compete à comunidade matemática nacional provar aos potenciais empregadores que lhes é útil seguirem essa via. Para isso, há que promover mais contactos com as empresas nomeadamente através da realização de estágios nas universidades (de pessoas ligadas à empresas) e nas empresas (de universitários).

Os parques tecnológicos associados a universidades também desempenham nos países mais desenvolvidos um papel importante na abertura dos mercados a pessoal altamente qualificado além de servirem como centros de produção de investigação tecnológica de ponta. Deviam porventura ser intensificados entre nós esforços no sentido de fomentar este tipo de elo de ligação entre as universidades e o tecido empresarial.

Se o mercado para doutorados em Matemática efectivamente aumentar, como penso que seria útil para o país, então podemos pensar na criação de escolas de doutoramento em vários departamentos de Matemática. Até lá, entendo que seria mais razoável criar uma única escola de doutoramento a nível nacional num modelo semelhante ao IMPA (Instituto de Matemática Pura e Aplicada) brasileiro. Nessa escola poderiam a médio prazo ser criados quadros próprios, mas ela devia também contar com a colaboração, devidamente protocolada, das universidades que desejassem associar-se, nomeadamente através da leccionação de cursos e da orientação de teses. O CIM poderia servir de quadro institucional para uma tal escola, sendo ele próprio uma associação sem fins lucrativos cujos sócios são a Sociedade Portuguesa de Matemática, universidades e centros de investigação.

Fica aqui a proposta que não sei sequer se terá entre nós algo de original. Compete à comunidade matemática, se com ela concordar, convencer o Ministério da Educação a reconhecer a escola e os graus por ela concedidos e o Ministério da Ciência e da Tecnologia e outras entidades como a Fundação Calouste Gulbenkian do interesse em apoiar uma iniciativa deste tipo.


Notas pós-debate

a) Em resposta a um comentário do Prof. José Francisco Rodrigues, acrescento que, não obstante considerar visitas (mais ou menos prolongadas) de pós-doutoramento essenciais na iniciação de uma carreira com uma componente significativa de investigação, penso que se trata de uma questão de tipo diferente que merece um tratamento diferenciado.

Talvez por ter em mente os modelos de pós-doutoramento por que eu próprio passei e que tenho proporcionado a visitantes nossos a esse nível, trata-se para mim da oportunidade de investigadores doutorados desenvolverem trabalhos de investigação integrados numa escola com cientistas seniores da especialidade. A componente de formação é essencialmente de hábitos de trabalho num ambiente propício. Este modelo é aliás o que é adoptado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia para as suas bolsas de pós-doutoramento.

Não há portanto a meu ver nada de diferente do que normalmente se devia passar numa escola de investigação pelo facto de acolher pós-doutorados e por isso dificilmente concebo este tipo de estágios como formação programada. A escola de acolhimento estará certamente interessada em receber pós-doutorados pela oportunidade de interagir com pessoas recém-doutoradas com grande potencial e pela projecção acrescida que um bom trabalho feito nesse contexto lhe pode trazer. Mas, de resto, as suas actividades não deviam ser particularmente afectadas por esse acolhimento, ao contrário do que se passa com os tipos de formação pós-graduada que optei por referir no debate.


b) Alguns departamentos pretendem avançar com programas de doutoramento incluindo uma parte escolar que poderá coincidir com a parte escolar de mestrados que já oferecem. É uma solução económica que permite a criação de programas de doutoramento sem esforço docente adicional. Por se tratarem de programas organizados poderão ter a vantagem de servir para testar a capacidade de atracção de estudantes tanto a nível nacional como internacional mas continuo convicto de que ficarão muito aquém da possibilidade de oferta de cursos e do potencial atractivo de uma única escola de doutoramento nacional. Além do mais, é natural que uma vez que um departamento avance por essa via outros sigam o mesmo caminho inundando assim de repente o mercado com um excesso de oferta de formação de doutoramento. Como os custos de manutenção serão negligenciáveis, só quando os graduados dessas escolas começarem a distinguir-se no mercado de trabalho surgirão as pressões para que os programas oferecidos por departamentos mais débeis sejam extintos.

 

Referências

[1] Página web do Observatório das Ciências e das Tecnologias através do endereço http://www.oct.mct.pt/Ctpor/douto.html.

[2] D. O. Loftsgaarden et al, 1999 Annual Survey of the Mathematical Sciences (first report) Report on the 1999 new doctoral recipients, Notices American Math. Soc. 47 n. 2 (2000) p. 231-243.

[3] A. Jackson, Declining student numbers worry German Mathematics departments, Notices American Math. Soc. 47 n. 3 (2000) p. 364-368.

 

 

 Notas de Rodapé

1 Fiquei a saber por contactos com colegas durante este debate que os departamentos de Matemática da Faculdade de Ciências de Lisboa e do Instituto Superior Técnico têm planos concretos para avançarem com programas de doutoramento mais substanciais enquanto outros departamentos estão a considerar a possibilidade de os criarem.

2 Na sequência desta intervenção, foi-me referido o caso, que suponho ser único, de um ex-docente do Instituto Superior Técnico que presentemente trabalha, em Portugal, para uma empresa multinacional da área das comunicações.

3 De acordo com dados que me foram fornecidos pelo Ministério da Educação, o número de vagas nas escolas postas a concurso na especialidade de Matemática desceu de 1504 para o ano lectivo de 1995/96 para 147 em 2000/01. Se fossem transferidos alguns docentes que já se encontram como excedentários nas escolas a que estão afectos, não haveria sequer lugares a concurso.

4 como sói dizer-se e nem sempre resulta a nosso favor...