Introdução

Em 1980 realizavam-se os 1º Encontros de Fotografia. E, ao longo da sua história, constituiram-se, por si próprios, uma instituição nacional no campo da divulgação e do conhecimento da fotografia.

A regularidade da edição dos Encontros de Fotografia, o seu reiterado papel pedagógico, a divulgação de obras seleccionadas pela crítica internacional e pela organização, tornar-se-iam os primeiros responsáveis pela expansão de um público amador de fotografia, suficientemente significativo para acorrer com entusiasmo crescente a este e a outros certames fotográficos; o que pode bem significar que o conhecimento da fotografia, no nosso país, deixou de ser uma extravagância de alguns iniciados e se incorporou num capital cultural a adquirir.

A invulgar continuidade desta realização cultural tem assentado, em grande parte, na deliberada actualização do modelo de intervenção. Mas também, e fundamentalmente, na progressiva afirmação deste certame no tecido cultural nacional e internacional e, sobretudo regional. Atraindo facilmente público do norte e do sul, os Encontros diversificaram, em Coimbra, os espaços de exposição, estabelecendo uma relação de redescoberta do património histórico e arquitectónico: muitos desses espaços foram recuperados e equipados para permitir novos modos de expôr. No actual quadro das realizações culturais que decorrem no centro do país, os Encontros são o acontecimento que movimenta maior volume de público, com maior cobertura mediática e, assim, um factor já imprescindível de animação da cidade e do turismo cultural.

Os Encontros trazem, desde início, a Portugal, de forma sistemática, o conjunto mais significativo de notáveis exposições estrangeiras que, na altura, instituições de estado ou de outra forma ligadas à fotografia, faziam circular; a título de exemplo, citaremos: Manuel Alvarez Bravo, August Sander, Jacques-Henri Lartigue, Henri Cartier-Bresson, Robert Frank, Duane Michals, Herbert List, Édouard Boubat, Walker Evans, Lisette Model, Ralph Eugene Meatyard, Jean Dieuzaide, Dieter Appelt, Ralph Gibson, Max Pam, Joel-Peter Witkin; a Fotografia Subjectiva Alemã, a Vanguarda Russa, a Colecção Graham Nash.

Daí - e também do modelo de festival que marcou os seus primeiros anos - um acentuado ecletismo que não impediu, no entanto, a afirmação de uma linha totalmente isenta de ambiguidades de opção estética, mas também sem preconceitos de tendência.

Mas também, desde a primeira hora, dedicam uma especial atenção à fotografia portuguesa: na galeria do Centro de Estudos de Fotografia que, inaugurada em 1979, é a primeira galeria portuguesa exclusivamente dedicada à fotografia, e nas sucessivas edições do festival mostraram-se nomes como Carlos Relvas, Augusto Cabrita, o Comandante António José Martins, Gérard Castello Lopes, Vitor Palla, Costa Martins, Sena da Silva, Paulo Nozolino, Jorge Molder, José Afonso Furtado, Albano da Silva Pereira, Luis Pavão, José Manuel Rodrigues, Manuel Miranda, Pepe Diniz, Daniel Blaufuks, António Pedro Ferreira, Mariano Piçarra, António Leitão Marques, Valente Alves, Rita Magalhães Barros, José Francisco Azevedo, Inês Gonçalves, lvaro Rosendo, Luis Palma, Duarte Belo, Adriana Freire, Bruno Sequeira e muitos outros.

Esta atenção à fotografia portuguesa determinou um esforço de desenvolvimento de pontes de diálogo com a produção internacional contemporânea, cruzando olhares e culturas, constituindo novos espólios: por um lado, numa linha pedagógica e formativa, proporcionou-se a oportunidade de ver as melhores produções internacionais e disponibilizaram-se as obras dos “grandes mestres”; promoveram-se itinerâncias das exposições no país e fora dele; finalmente, produziram-se projectos de fotógrafos portugueses que tiveram oportunidade de trabalhar fora do país.

Além de pesquisar novos valores da fotografia portuguesa, os Encontros têm vindo continuadamente a investigar a história passada da fotografia nacional: revisitaram autores semi-esquecidos ou mesmo totalmente desconhecidos na história da fotografia portuguesa, do século XIX e XX, inspirando monografias várias e criando o desejo de uma produção histórica e crítica cada vez mais rigorosa. A título de exemplo, citaremos: Viagens em Angola, 1877-1897, J.A. da Cunha Moraes; Na Índia dos Vice-Reis, Imagens da Saudade Antecipada: fotografias de Souza & Paúl e Adolpho Moniz; No Trilho dos Cavalos de Ferro, Imagens dos Albuns de Caminhos de Ferro do Minho, Douro e Beira Alta da Casa Biel; Finisterra, Imagens de Orlando Ribeiro.

A partir de 1993, a linha orientadora dos Encontros tornou-se fortemente tematizada, respondendo a um critério que se considera responder às características da procura contemporânea, tanto na fotografia como noutros campos de intervenção e análise. Deste esforço resultaram exposições temáticas, colectivas ou individuais, obedecendo a projectos próprios ou resultando da identidade que lhes é encontrada.

Foi desde então que os Encontros se afirmaram como o mais importante encomendador de fotografias no nosso país, tendo produzido levantamentos temáticos em que intervieram fotógrafos nacionais e estrangeiros e construindo assim, além de uma importante colecção fotográfica, um corpo de imagens sobre o país do fim de século, cujo valor documental e estético é inegável.

Esta procurada articulação da fotografia com um alargado campo de interesses suscitou o recurso ao conhecimento e experiência interdisciplinares, e ao apoio teórico de um leque de especialistas, da geografia à história, à arquitectura, à sociologia e antropologia social. Suscitou também a procura de contiguidades sempre presentes: entre fotografia e literatura, entre fotografia e artes plásticas.

Tornou-se imperativo que obra assim desenvolvida permanecesse sobre o efémero da festa, em publicações que constituem o fundo bibliográfico mais extenso produzido recentemente em Portugal. Nos últimos anos, um esforço progressivamente maior tem sido posto na vertente edição dos Encontros, substituindo os tradicionais catálogos por álbums onde o texto se cruza com a imagem.

Ao longo dos anos desta realização, o festival tornou-se um "forum" sempre à disposição, onde estiveram presentes, comunicando directamente com o público, alguns dos- já - mitos da fotografia contemporânea: como Robert Frank, como Manuel Alvarez Bravo, como J.-P. Witkin, entre muitos outros. Debateu-se a história da fotografia, a sua produção, as suas correntes e a sua crítica, com nomes como Pedro Miguel Frade, Joachim Schmidt, Paul Hill, Gabriel Bauret, Gilles Mora, Anne Tucker, Graham Howe, Howard Greenberg, Miles Barth, Joan Fontcuberta, Alan Porter ou Alain Desvergnes, entre outros especialistas nacionais e estrangeiros. Esta vertente pedagógica, que se estabeleceu desde a primeira hora, e se manifesta também na realização de workshops teóricos e práticos.